domingo, 26 de fevereiro de 2012

Lutas pela Igualdade

Lutas pela Igualdade

As lutas pela Igualdade são típicas do Século XX. As revoluções de esquerda são sinais do sucesso de uma ideologia cujo objetivo original é reduzir, se não abolir, as disparidades sociais, É possível então pensar que a conquista das liberdades tenha sido condição necessária para a luta pela igualdade, visto que sentido não faz que alguém não livre, o que consiste em ser desigual em relação a outros, possa lutar pela igualdade se não tem liberdade.
Seguramente, a liberdade conquistou um grande espaço em nosso mundo contemporâneo, em relação ao mundo moderno e ainda mais ao medieval. A simples possibilidade de movimentação entre os grupos sociais, facilitada pela liberalização religiosa, política, e pelo enfraquecimento dos valores que estabeleciam o sistema de "castas" feudal, já contribuiu para promover também, em paralelo, algum tipo de igualdade.
Se antes, só os de sangue azul podiam ser reis, depois é ao menos possível que o cidadão comum chegue à chefia máxima de um país, democrático, é claro.
Porém, esgotadas as possibilidades de realização da Igualdade que a mera liberalização da sociedade pôde promover, veio a necessidade de promovê-la ainda mais por meios outros que o da mera elevação da Liberdade individual, visto que essa, em geral, está mais focada em abrir possibilidades ao indivíduo que já tem um potencial maior de realização.
Outros indivíduos porém, sofrem de um menor potencial, e não por uma questão intrínseca, mas pelas péssimas condições em que nasceram, ou foram lançados, cresceram e chegaram ao estágio de vida onde as tradições culturais esperam absorvê-lo definitivamente na homogeneidade de pensamento.
Indivíduos assim, de certo modo, são tão livres para acessar as maiores conquistas da civilização quanto o é o analfabeto à quem é liberada uma magnífica biblioteca. Os primeiros passos da promoção da Igualdade só podem ser, então, óbvios. Trata-se de oferecer ao máximo de pessoas possível, principalmente aos menos favorecidos, meios para que possam de fato utilizar os acessos.
Mas, se é lugar comum afirmar que a Liberdade tem seu preço, também deveria sê-lo afirmar que a Igualdade não é de graça, com, possivelmente, um agravante. O preço da Liberdade normalmente recai principalmente sobre o próprio indivíduo que dela se beneficia, já o preço da Igualdade, pela sua própria natureza, não pode recair de forma tão pontual, mas sim disseminar-se rumo aos "iguais" que lhe sejam próximos.
Os afro-descendentes que ficaram livres da escravidão tiveram que se adaptar a uma nova condição que impôs diversas dificuldades, e que em muitos casos foram solucionadas abrindo mão de parte dessa liberdade. Embora tenha havido um custo social envolvido que afetou principalmente setores mais privilegiados, no caso, a perda da mão de obra escrava, esse custo foi rapidamente compensado pelo fortalecimento de um sistema de produção remunerado que, se não tem direito sobre a vida do indivíduo, também não tem obrigação de sustentar suas necessidades primárias, mas sim, apenas de lhe oferecer um salário. Além de não ter o alto custo consciencial que a prática da escravidão cobrou às mentes mais sensíveis e lúcidas.
Já disponibilizar um sistema educacional público que ofereça a todos ensino de qualidade, bem como um sistema de saúde, habitação e segurança pública que garantam suas necessidades fundamentais, tem um custo que fatalmente recairá sobre toda a sociedade, e cuja compensação demorará, por definição, gerações para se fazer sentir.
Em parte, talvez, pela percepção intuitiva dessa relação, os movimentos ideológicos de esquerda têm poucas reservas quanto a onerar o estado e a sociedade pela promoção da Igualdade, mas o custo deste ideal não é apenas econômico, há também um custo sobre a própria liberdade em si, ou ao menos à sua percepção por alguns indivíduos.
Uma liberdade igualitária é muito interessante para quem esteja nos estágios iniciais da realização pessoal, mas à medida que tais estágios venham sendo superados, o apelo começa a ser transferido da liberdade coletiva para a mera liberdade individual. Isso significa que o indivíduo que obteve grandes conquistas em sua realização, e em geral isto é entendido como o indivíduo que ascendeu econômica e socialmente, só pode usufruir de certos benefícios deste nível mais alto se puder contar com desigualdades institucionais presentes.
Se não houvesse alguém que, por necessidade econômica, estivesse disposto a vender um serviço de faxina, o indivíduo bem sucedido sócio economicamente necessitaria ele próprio exercê-la, ou pagar um preço necessariamente maior. Se não houvesse quem, por carência econômica, estivesse disposto a alugar sua força de trabalho como construtor civil, não haveria, ou haveria pouca oferta para atender a carência estética e simbólica por uma moradia personalizada e sofisticada que os que não sofrem de carência econômica costumam desenvolver. Se não houvesse mulheres que, por imperativos econômicos, não estivessem dispostas a oferecer seus encantos anatômicos a homens que, na falta de encantos equivalentes, mas na sobra de encantos monetários, precisam satisfazer mais plenamente seus imperativos biológicos, então, eles teriam muito mais trabalho interpessoal em campanhas românticas.


Marcus Valério


http://www.xr.pro.br/Ensaios/lgualdade-Liberdade.html

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